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As Imagens e as Vozes da Despossessão: A Luta pela Terra e a Cultura Emergente do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra)

Língua:

Português (change language to English)

Esta página:

Cultura emergente por tipo de mídia -> Desenhos das crianças 16 recursos (Organizado por Else R P Vieira. Tradução © Thomas Burns.)

    recurso: 1 de 16    Seguinte

Autor:

Else R P Vieira

Título:

Os desenhos dos sem-terrinha: A história em revisão

Os desenhos de crianças aqui incluídos foram, em sua maioria, premiados em concursos nacionais anuais de desenho e redação promovidos pelo MST nas escolas dos acampamentos e assentamentos. O MST se orgulha de já ter contribuído, até 1999, com a educação de mais de 100.000 crianças e adolescentes nos acampamentos e assentamentos.

Vale notar a relativa inadequação de se denominar este arquivo "Desenhos de Crianças". Na realidade rural brasileira, a exclusão não é apenas da terra enquanto meio de produção; outras graves ausências compõem esse quadro multifacetado, como a falta de acesso à educação básica para muitas crianças. Cita-se o exemplo comovente de Ozeri, do Acampamento Emiliano Zapata, em Uberlândia, Minas Gerais. Aos 54 anos ele freqüenta uma escola itinerante. Optando por contribuir para o concurso com seu artesanato, Ozeri constrói uma miniatura de uma casa com os materiais e a técnica de um ninho, simbolizando a realização do sonho de uma moradia que seja teto e afeto.

Uma desenho, incluído na seção "Despossessão" deste arquivo, revela a percepção das crianças do processo de exclusão como sendo resultante do "roubo" da terra; o dragão das estórias infantis se transforma em ladrão. Um sentido das raízes históricas do problema da terra se manifesta pela representação dos indígenas como as vítimas desse roubo. O processo inverso, de acesso a uma moradia e à terra, representa-se como um sonho que se concretizou.

Especificamente com relação à tematica dos concursos, o primeiro, realizado no ano de 1998, dizia respeito aos projetos de vida das crianças Sem Terra. A partir da proposição "O Brasil que queremos ter", as crianças fizeram inúmeras composições. Muitas das composições premiadas nesse primeiro concurso se encontram no arquivo Composições das Crianças.

Em 1999 foi realizado um segundo concurso em torno dos 15 anos do MST. Uma primeira etapa teve objetivo arqueológico, ou seja, o registro da memória do Movimento. Para tal, solicitou-se às escolas que realizassem pesquisas e registros das histórias de cada acampamento e assentamento. Às crianças, na segunda etapa, solicitou-se a produção de uma mensagem artística ao MST. Dignidade, ternura, esperança, escolaridade, moradia são elementos que afloram nas mensagens dessas crianças.

O concurso realizado no ano 2000, trouxe à tona um questionamento da história oficial. Enquanto a imprensa focalizava a comemoração dos 500 anos do descobrimento do Brasil e o governo construía uma réplica das caravelas portuguesas que chegaram ao Brasil em 1500, a pergunta proposta, "Brasil, quantos anos você tem?", introduzia um discurso problematizador da própria cronologia oficial. Os males do Brasil desde o seu descobrimento, representados pelas crianças em seus desenhos, como a estrutura secular do latifúndio, a violência com os indígenas e a recolonização do Brasil pelos Estados Unidos são componentes menos de uma celebração e mais de uma revisão da história. A interpelação da história e as representações de um outro Brasil culminam com um painel de autoria coletiva, uma grande bandeira nacional que compartilha com a oficial apenas as cores muito vivas. Mas outros matizes da história nacional se deixam entrever. As caravelas chegam no azul forte deste painel. No centro, um emblema transformado da bandeira oficial oferece um convite para se lançar um outro olhar sobre a nação: um único índio, cujo rosto ocupa todo o mapa do Brasil ao centro da bandeira. Um único índio, de semblante profundamente triste, que derrama lágrimas de sangue.

Um índio, uma nação. Uma nação de despossuídos.

Data:

novembro de 2002

Recurso ID:

CHILDREN524

		À Universidade da página bem-vinda de Nottingham

Vozes Sem Terra, site hospedado pela
School of Languages, Linguistics and Film
Queen Mary University Of London, Grã-Bretanha

Coordenadora do Projeto e Organizadora do Arquivo: Else R P Vieira
Produtor do Web site: John Walsh
Arquivo criado em janeiro de 2003
Última atualização: 07 / 05 / 2016

www.landless-voices.org