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As Imagens e as Vozes da Despossessão: A Luta pela Terra e a Cultura Emergente do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra)

Língua:

Português (change language to English)

Esta página:

Categorias culturais por tipo de mídia: A especificidade da expressão cultural dos Sem Terra por mídia.

Categoria cultural:

 A luta pela terra: Despossessão, viagens, ocupação, despejo

  2 recursos

Tipo de mídia:

 Poemas

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Este recurso se encontra também em:

Poemas

Autor:

Irmã Teresa Cristina (4)

Título:

A história dos trabalhadores da fazenda São João dos Carneiros (1)

Numa pequena fazenda
Depois de uma missão
Foi feito um primeiro encontro
Quando chegou o patrão
Dizendo não permitir
Que fizessem reunião.

Um dia saiu um boato
Que o patrão tinha vendido
A referida fazenda
A um médico desconhecido
Sem avisar aos posseiros
Que já tinham preferido.

Do triste acontecimento
A turma foi informada
Todas as benfeitorias
Tinham entrado na enrolada
Suor de quarenta anos
Foi injustamente roubado.

Uma ação de preferência
Na justiça deu entrada
Começaram as agressões
A opressão organizada
Envenenaram animais
E a água foi trancada.

Assim passaram dez meses
De espera e tormento.
Com muita humilhação
Aguardavam o julgamento
mas pra justiça corrupta
Não importa sofrimento.

cerco foi apertando
Pra aquela gente sofrida
Só se falava em despejo
E ameaças de vida
Sem nenhuma garantia
A classe era perseguida.

Depois de muitos encontros
Chegaram a uma conclusão
Trinta famílias iriam
Fazer aquela ocupação
Era a única saída
Pra resolver a questão.

Dia e hora foi marcado
Ficou tudo combinado
Como se ia fazer
E quem seria informado
A divisão de tarefa
Tudo ficou programado.

Mas em toda terça-feira
Tinha muita apreensão
Com ameaças de despejo
Era aquela aflição
Mas Deus sempre protegeu
Nos livrou da humilhação.

Pra desapropriação
governo apressar
Fomos acampar no INCRA
Três dias ficamos lá
Só voltamos com a certeza
Que iam nos apoiar.

Disfarçada de repórter

A UDR foi lá
Verificar o ambiente
Para poder atacar
A turma inexperiente
Nem chegou a desconfiar.

Perto do acampamento
Uma senhora pegaram
Com um revólver na cabeça
Sua boca amordaçaram
Ameaçando matá-la
A roupa e bolsa rasgaram.

Vinte e quatro de outubro
Não podemos esquecer
Quando Sarney (2) viajou
E Paes (3) ficou no poder
A desapropriação
Ele procurou fazer.

Não foi feito o pagamento
dinheiro foi desviado
Foi mais uma decepção
Pra quem já estava cansado
De novo Sarney viaja
E Paes assume o reinado.

Agora o dinheiro sai
Disto nós tínhamos certeza
A ausência de Sarney
Pra nós era uma beleza
Realmente a verba veio
Pra amenizar a dureza.

Foi válida a experiência
E muita gente cresceu
Uma lição pro opressor
A nossa turminha deu
A força da organização
Muita gente percebeu.

Que nossa luta continue
Os companheiros se unir
Desafiando a UDR
Terra livre conseguir
E assim uma nova História
Bem depressa vai surgir.

1 Poema narrativo dentro da tradição do cordel, literatura popular em versos, típica do Nordeste brasileiro. Originalmente, as histórias eram muitas vezes notícias narradas em versos, disseminadas pelos cantadores nas feiras de diversos lugares. Esse poema registra o processo de expropriação e ocupação como forma de acesso à terra. A Fazenda São João dos Carneiros é associada a uma grande vitória da luta pela terra em 1989. O ocorrido foi em Quixadá, no estado nordestino do Ceará, uma região historicamente associada a grandes conflitos agrários; ela é, ademais, constantemente assolada por problemas de seca.

2 Sarney (José Sarney): Presidente do Brasil (1985-1990).

3 Paes (Antônio Paes de Almeida) Presidente da Câmara dos Deputados que exerceu a Presidência da República, por motivo de viagem do Presidente da República

4 Irmã Teresa Cristina: uma religiosa ligada à Comissão Pastoral da Terra (CPT), que teve um papel importante na genealogia do MST.

Poemas : Editado por Else R P Vieira. Tradução © Bernard McGuirk.

Data:

novembro de 2002

Recurso ID:

STORYOFT099

Glossário

Compilado por Else R P Vieira. Tradução © Thomas Burns.

Desapropriação
"É uma ação de competência do Estado, que por meio da Lei transfere um imóvel particular para o domínio público, com o objetivo de implantar um assentamento rural" (Fernandes, Bernardo Mançano. Pequeno Vocabulário da Luta pela Terra. Inédito). 

INCRA - Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
"Foi criado em 1970, no governo militar do general Emílio Garrastazu Médici, para ser o órgão executor da reforma agrária. Foi extinto em 1987, no primeiro governo da Nova República - José Sarney, e recriado em 1989, pelo mesmo governo. Hoje está vinculado ao Ministério do Desenvolvimento Agrário - MDA. Desde sua fundação tem executado projetos de colonização e de assentamentos rurais" (Fernandes, Bernardo Mançano. Pequeno Vocabulário da Luta pela Terra. Inédito). 

Ocupação
"É uma ação organizada das famílias sem-terra na apropriação de uma área, em um latifúndio, com objetivo de pressionar o governo para a desapropriação do latifundiário e a implantação de assentamento rural. Desse modo, é um espaço de luta e resistência e tem sido a principal forma de acesso à terra" (Fernandes, Bernardo Mançano. A formação do MST no Brasil. Editora Vozes, 2000, p. 281). 

Posseiro
"É o camponês que, tendo a posse da terra, não é proprietário. Para ser proprietário é preciso ter a posse e o domínio, por meio de uma certidão de propriedade que no Brasil é denominada escritura" (Fernandes, Bernardo Mançano. Gênese e Desenvolvimento do MST. São Paulo: MST, 1998, p. 56). 

UDR (União Democrática Ruralista)
"Fundada em 1985 por fazendeiros (...) do setor pecuarista e contrários à reforma agrária. No início atuou mais em Goiás, sul do Pará, Pontal do Paranapanema (São Paulo) e Triângulo Mineiro; depois espalhou-se por vários estados. Atuava de diversas formas, organizando os fazendeiros, articulando milícias armadas, pressionando o governo e os parlamentares. Teve destacada atuação contra a reforma agrária durante a Constituinte. Seu declínio começou no final de 1988, quando foi assassinado, no Acre, Chico Mendes, dirigente sindical e lutador a favor da reforma agrária. Sua morte foi executada por fazendeiros da UDR. A mesma acusação pesa contra eles no assasinato do padre Josimo Tavares, em 1986, em Imperatriz (Maranhão). Seu ocaso completou-se em 1989, quando lançou seu principal dirigente (Ronaldo Caiado) como candidato à presidência da República, isolando-se dos demais partidos conservadores. A partir de 1990, encerrou suas atividades. Foi reaberta em 1996, mas somente na região do Pontal do Paranapanema, com uma insignificante participação de fazendeiros retrógrados. A sociedade brasileira ea opinião pública refutaram a UDR desde a sua fundaçõ em virtude de seus métidos violentos e suas propostas políticas atrasadas" (Fernandes, Bernardo Mançano e Stedile, João Pedro. Brava gente: a trajetória do MST e a luta pela terra no Brasil. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 1999, nota 8, p. 93). 

Antologia de poemas
Uma seleção de primeira mão, inédita dentro e fora do Brasil. Uma poética militante; a importância social e política do cantador, a construção de um cânone da despossessão; a mulher sem-terra; o tema da morte como horizonte de vida; o projeto pedagógico.
Else R P Vieira

		À Universidade da página bem-vinda de Nottingham

Vozes Sem Terra, site hospedado pela
School of Languages, Linguistics and Film
Queen Mary University Of London, Grã-Bretanha

Coordenadora do Projeto e Organizadora do Arquivo: Else R P Vieira
Produtor do Web site: John Walsh
Arquivo criado em janeiro de 2003
Última atualização: 07 / 05 / 2016

www.landless-voices.org