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As Imagens e as Vozes da Despossessão: A Luta pela Terra e a Cultura Emergente do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra)

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Português (change language to English)

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Estudos, depoimentos & referências -> Evento 2 recursos (Organizado por Bernard McGuirk e Else R P Vieira. Tradução © Adriana Rouanet.)

    recurso: 1 de 2    Seguinte

Autor:

Else R P Vieira

Título:

Colóquio Vozes Sem Terra: Sinopses

1 Robert Young, A condição sem-terra no pós-colonial
2 Stephen Regan, Vozes Sem Terra na Literatura Irlandesa
3 Parvati Nair, Canções do chão, Canção sem chão: mobilidade, intercâmbio e representação no cante de las minas, do século dezenove, de Almería, sul da Espanha
4 Sheila Khan, Rostos sem identidade: Ser 'negro' durante o colonialismo português.
5 Richard Siddle, Um evento que marca época? O Ato de Promoção Cultural Ainu de 1997 e seu impacto
6 Frei Betto, A Igreja e os Movimentos Sociais no Brasil
7 Bernardo Mançano Fernandes, A Ocupação como forma de acesso à terra.
8 Plínio Sampaio Arruda, A Mística do MST
9 Paul Heritage, Cruzamentos de fronteira: como fazer teatro em prisões brasileiras.
10 Bernard McGuirk, A Poesia e/como protesto
11 George Landow, Vozes Sem Terra e as Novas Tecnologias
12 Else R P Vieira, O cânone e a cultura da despossessão

 

1 Robert Young, A condição sem-terra no pós-colonial

No meu texto recente, "Pós-colonialismo: uma introdução histórica", argumento que a teoria pós-colonial é um discurso comprometido moral e politicamente com a transformação das condições de exploração e pobreza em que transcorre a vida cotidiana de grande parte da população mundial e que num nível conceitual, ela representa uma re-orientação epistemológica em direção à base e uma perspectiva aberta a conhecimentos e necessidades não-ocidentais. Porém, a questão da condição sem terra não figura, aparentemente, nas reflexões 'pós-coloniais', nem em termos de suas preocupações típicas, nem de seu quadro teórico. Realmente, a ênfase no nomadismo, na migração, na performatividade da itentidade, parecem endossar, em vez de problematizar, a noção da condição sem terra. Na minha apresentação, concentro-me nas questões que surgem dessa contradição.


2 Stephen Regan, Vozes Sem Terra na Literatura Irlandesa

Essa apresentação examinará como imagens e idéias da terra atuaram nas relações Anglo-Irlandesas, desde a fase inicial de ocupação colonial ou 'plantação' e da resposta militante da Land League no final do século dezenove, até os anos problemáticos da partição. Vai concentrar-se em obras de literatura irlandesa moderna (principalmente dos dois recipientes do Prêmio Nobel, W.B. Yeats e Seamus Heaney) em que a recuperação e reapropriação do território perdido constituem preocupações fundamentais.


3 Parvati Nair, Canções do chão, Canção sem chão: mobilidade, intercâmbio e representação no cante de las minas, do século dezenove, de Almería, sul da Espanha

Esse trabalho examina o desenvolvimento inicial da forma, agora bem caracterizada, da canção flamenca conhecida como cante de las minas, ou canção das minas. Meu objetivo é problematizar a relação entre a condição Sem Terra e a representação vocal, analisando até que ponto o cante minero constrói e desafia as fronteiras que demarcam modos de representação social e cultural, ou com elas estabelece relações de cumplicidade.


4 Sheila Khan, Rostos sem identidade: Ser 'negro' durante o colonialismo português.

Nessa apresentação, sugerirei que a expressão vozes Sem Terra precisa ser compreendida não só como uma conseqüencia direta de circunstâncias sociais, culturais, econômicas e políticas, mas também como uma metáfora identitária.Assim, argumentarei que a noção de etnia precisa ser concebida como uma 'estratégia identitária que indivíduos usam para criar sentido, para produzir e reproduzir relatos de eventos relacionados com sua vida interior.

Para desenvolver esse argumento e deixar clara minha posição metodológica, vou recorrer a três ferramentas inter-relacionadas. Primeiro, vou argumentar que o sistema colonial português era um instrumento de silêncio cultural imposto ao povo moçambicano e, por consequinte, esse silêncio precisa ser concebido como exemplo rico de vozes Sem Terra. Segundo, vou descrever alguns exemplos de literatura e poesia moçambicana, para poder ressaltar claramente as advertências culturais nascidas no bojo do colonialismo português, e para salientar a função da literatura e poesia moçambicana como uma voz contra o silêncio cultural imposto. Finalmente, vou usar declarações, tiradas de entrevistas aprofundadasem andamento, principalmente em Londres, sobre as estratégias de aculturação e identidade utilizadas por negros moçambicanos que deixaram seu país com destino a Portugal e, mais tarde, à Inglaterra.


5 Richard Siddle, Um evento que marca época? O Ato de Promoção Cultural Ainu de 1997 e seu impacto

Os Ainu são o povo indígena do norte do Japão. Sua história constitui, em parte, uma luta por sua representação discursiva. Ideologicamente marginalizados como uma "raça em extinção" necessitando "proteção", uma imagem que moldou políticas concretas que promoveram sua subordinação ao Estado, os Ainu têm reagido, desde os anos setenta, ao se recriarem como um "povo indígena". Suas vozes, porém, tem permanecido mudas em um Japão, que continuou a representar-se como "racialmente homogêneo". Porém tudo isso pareceu mudar no dia 1 de julho de 1997, quando entrou em vigor no Japão a primeira legislação para promover uma cultura étnica anticonvencional e encorajar o multiculturalismo no interior da sociedade japonesa. A promulgação do Ato de Promoção Cultural Ainu (APC) foi recebida entusiasticamente por seus defensores como um evento que "marcou época". Assim , o governo japonês finalmente resolveu seu "problema Ainu", fazendo justiça e reconhecendo direitos humanos aos habitantes originais de Hokkaido, despojados, marginalizados e empobrecidos pela exploração colonial daquela ilha após 1869? Ou a retórica de acontecimentos que "marcam época" obscurece uma realidade política que na verdade mudou muito pouco? Nesse paper vou argumentar que o APC representa apenas uma concessão marginal por um estado paternalista. Políticos continuam a fazer afirmações de "estado homogêneo". Críticos argumentam que o movimento Ainu descarrilhou, e que a cultura Ainu, longe de ser "promovida", está presa numa estrutura de opressão pouco diferente da que prevalecia durante a política oficial de assmilação. Apesar de passados apenas quatro anos desde a promulgação do APC, vou tentar avaliar nesse paper o impacto inicial dos movimentos Ainu em prol de direitos políticos e humanos e sua posição na sociedade japonesa no alvorecer de um novo século.


6 Frei Betto, A Igreja e os Movimentos Sociais no Brasil

Esse paper descreve as atividades do MST (Movimento Sem Terra) no Brasil, situando suas demandas por justiça, empregos e reforma agrária no contexto de um país em que apenas 1% de proprietários de terra possuem 44% da terra do país inteiro. A filiação do MST à Igreja Católica é explorada a partir da perspectiva de um frei dominicano diretamente envolvido com o movimento. As realizações do MST na última década são delineadas e a participação do movimento na reforma agrária é avaliada. O sofrimento dos Sem Terra é reconhecido como um grande problema político para um governo em que falta a vontade de agir, apesar das provas de apoio da população aos objectivos do MST. Várias propostas de reforma são feitas e a implantação de movimentos sociais dentro da Igreja é contextualizada em termos da Teoria da Libertação.


7 Bernardo Mançano Fernandes, A Ocupação como forma de acesso à terra.

No Brasil, nas últimas décadas, a ocupação passou a constituir uma forma importante de acesso à terra, na medida em que pressiona o governo a desapropriar latifúndios e a efetivar uma política de assentamentos rurais. Como forma de intervenção dos trabalhadores no processo político e econômico de expropriação, as ocupações forçam uma reforma agrária que o governo elaborou mas deixou de implementar. Esse paper vai analisar a maneira como os Sem Terra, através de ocupações desse tipo, passaram a se especializar na luta para conquistar e territorializar o MST. A apresentação será acompanhada de imagens e documentários em video sobre o MST.


8 Plínio Sampaio Arruda, A Mística do MST

O MST é o inimigo público número um da elite brasileira. O movimento não procura permissão para suas ações diretas, entre outras a de administrar centenas de escolas para milhares de alunos dos Sem Terra na terra ocupada por seus membros. Esse paper argumenta que o MST obtém a força para seus grandes empreendimentos de sua mística. Essa mística, segundo meu argumento, está ancorada no milenarismo do homem rural. O fenômeno brasileiro é situado no contexto de movimentos históricos e culturais em outras regiões, desde o século quinze ao dia atual.


9 Paul Heritage, Cruzamentos de fronteira: como fazer teatro em prisões brasileiras.

O tema desse paper será meu próprio projeto: Direitos Humanos em Cena, um projeto de base teatral atualmente sendo implementado em 37 prisões no estado de São Paulo. Até dezembro de 2001 o projeto terá envolvido mais de 10,000 guardas e prisioneiros em discussões sobre os direitos humanos no sistema de justiça penal. O projeto foi financiado pelo UK Community Fund, e serve de base para um projeto de pesquisa sediado na Queen Mary, University of London.


10 Bernard McGuirk, A Poesia e/como protesto

Haroldo de Campos não é nenhum anjo, muito menos em sua própria prática poética. Ele é ilimitadamente confiante, ou pelo menos o suficiente para denunciar todos os dogmatismos e todos os excessos críticos e ideológicos, normalmente antecipando-se aos polemistas do mundo acadêmico internacional. Agudamente consciente de que os brasileiros neo-hegelianos, como seus pares em outros países, em sua determinação de confrontar a brutalidade de grande parte da sociedade latino-americana, caem exatamente na armadilha de um discurso por demais mimético dessa realidade bruta, espelhando-a excessivamente para que a obra possa jamais alcançar alguma distinção, Haroldo de Campos convoca a figura da poesia em pessoa. Ele sabe que a poesia é uma grande provocadora, fisgando os rígidos realistas contemporâneos ou os trôpegos porta-vozes de todas as teorias do reflexo, passadas e presentes. Leituras de seu 'o anjo esquerdo da história' e minha tradução desse texto como 'o anjo à esquerda da história' vão opor-se aos pressupostos de críticos como Roberto Schwartz no que diz respeito à relação (não) mediatizada entre política e poesia, ou seja: uma elite minúscula se dedica a copiar a cultura do Velho Mundo e se torna incapaz de criar coisas próprias, que emergem das profundezas da vida e história brasileira (1992:85-89).


11 George Landow, Vozes Sem Terra e as Novas Tecnologias

Essa apresentação será uma demonstração das possibilidades tecnológicas envolvidas no uso de websites na difusão de ações políticas, ideológicas e culturais, como as de vários movimentos Sem Terra pelo mundo afora. Mostrará como a web torna materiais acessíveis a um público infinitamente mais amplo, incluindo ( mas indo além disso) escolhas em matéria de poesia, canto e imagem.


12 Else R P Vieira, O cânone e a cultura da despossessão

Essa apresentação de primeira mão dos arquivos pictóricos e musicais, bem como da antologia de poesia e canções da recente cultura da condição Sem-Terra, produzida pelos próprios despossuídos, é uma boa ocasião para descrever as grandes tendências estéticas e temáticas desse cânone artístico emergente. A construção de utopias terrestres, "escovando a história a contra-pelo" (Benjamin), uma retórica de resistência, a natureza comunitária da experiência artística, são meros exemplos de como a atitude de resignação individual vai se deslocando em direção ao que Derrida chama a "ferida no corpo da história". As hipóteses de uma volta à poética materialista e da concepção do estético em termos revolucionários permite um paralelo, por exemplo, com a chamada arte da resistência e com as lutas de libertação nacional. Serão feitas comparações com o cânone literário revolucionário na América Latina e mais específicamente com a negociação das epistemologias do Marxismo e do Cristianismo no projeto artístico da Revolução Nicaraguense.

Data:

novembro de 2002

Recurso ID:

CONFEREN657

Glossário

Compilado por Else R P Vieira. Tradução © Thomas Burns.

Reforma Agrária
"É uma política pública para democratizar o acesso à terra. É uma intervenção política do Estado para desconcentrar a estrutura fundiária. Segundo o Estatuto da Terra, de 1964, que é a referência utilizada pelo governo, a reforma agrária é um conjunto de medidas para promover a melhor distribuição da terra, com modificações no regime de posse e uso, que atendam os princípios de justiça social e ao aumento da produtividade. Hoje, no Brasil, este conceito está banalizado pela utilização de significados impróprios que deturpam os princípios dessa política. Por exemplo: por meio de convênio com o Banco Mundial, o governo vem desenvolvendo um conjunto de políticas de financiamento para compra e venda de terras, e as tem denominado de reforma agrária" (Fernandes, Bernardo Mançano. Pequeno Vocabulário da Luta pela Terra. Inédito). 

Latifúndio
Latifúndio ou grande propriedade rural tem duas definições: latifúndio por dimensão, que é o imóvel rural com área superior a seiscentas vezes o tamanho médio da propriedade familiar; latifúndio por exploração é o imóvel rural com área inferior a seiscentas vezes o tamanho médio da propriedade familiar e cujas terras não são exploradas (Fernandes, Bernardo Mançano. Pequeno Vocabulário da Luta pela Terra. Inédito). 

Teologia da Libertação
"Corrente pastoral das Igrejas cristãs que aglutina agentes de pastoral, padres e bispos progressistas que desenvolvem uma prática voltada para a realidade social. Essa corrente ficou conhecida assim porque, do ponto de vista teórico, procurou aproveitar os ensinamentos sociais da Igreja a partir do Concílio Vaticano II. Ao mesmo tempo, incorporou metodologias analíticas da realidade desenvolvidas pelo marxismo. Dessa corrente surgiram diversos pensadores importantes, entre eles Gutierrez, no Peru, Clodovis Boff e Leonardo Boff, Hugo Asman, do Brasil. A maioria dos precursores é da América Latina" (Fernandes, Bernardo Mançano e Stedile, João Pedro. Brava gente: a trajetória do MST e a luta pela terra no Brasil. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 1999, nota 12, p. 20). 

Mística
"É um ato cultural e político desenvolvido por meio de diversos rituais, quando os sem-terra expressam suas leituras das realidades vividas, por meio da poesia, da música, da mímica, da pintura, da arte em geral. É também uma forma de linguagem dos iletrados que constróem suas expressões, se comunicam e se interagem na construção da consciência da luta pela terra" (Fernandes, Bernardo Mançano. Pequeno Vocabulário da Luta pela Terra. Inédito). V. também COMISSÃO PASTORAL DA TERRA (CPT) e TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO 

Ocupação
"É uma ação organizada das famílias sem-terra na apropriação de uma área, em um latifúndio, com objetivo de pressionar o governo para a desapropriação do latifundiário e a implantação de assentamento rural. Desse modo, é um espaço de luta e resistência e tem sido a principal forma de acesso à terra" (Fernandes, Bernardo Mançano. A formação do MST no Brasil. Editora Vozes, 2000, p. 281). 

		À Universidade da página bem-vinda de Nottingham

Vozes Sem Terra, site hospedado pela
School of Languages, Linguistics and Film
Queen Mary University Of London, Grã-Bretanha

Coordenadora do Projeto e Organizadora do Arquivo: Else R P Vieira
Produtor do Web site: John Walsh
Arquivo criado em janeiro de 2003
Última atualização: 07 / 05 / 2016

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