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As Imagens e as Vozes da Despossessão: A Luta pela Terra e a Cultura Emergente do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra)

Língua:

Português (change language to English)

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Estudos, depoimentos & referências -> Depoimentos de Intelectuais e Artistas 13 recursos (Compilado por Else R P Vieira. Tradução © Bernard McGuirk.)

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Autor:

Tetê Morais
(Diretora e produtora brasileira. Documentários pioneiros e inovadores sobre os conflitos da terra e a mulher. Várias premiações nacionais e internacionais.)

Título:

Da Terra ao Sonho de Rose

"Em 1984 e 85, quando eu estava fazendo um trabalho para a televisão BBC de Londres, com uma equipe inglesa, que era uma série de documentários sobre o Brasil, viajamos por todo o país. E uma coisa que me impressionou muito naquela época foi que em quase todos os lugares que nós chegávamos no interior nos defrontávamos com conflitos de terra.
(...)
Aí comecei a pensar que queria fazer um filme, um documentário brasileiro sobre a questão da terra, e decidi também que queria relacionar mulher e terra, uma vez que a presença das mulheres em todas essas situações era muito forte, muito poderosa, e a mulher está muito ligada à questão da manutenção da vida, do cotidiano, da alimentação... isto também é uma característica da mãe-terra.
(...)
Fiz então um projeto chamado Mulheres da Terra, que foi aprovado num concurso da EMBRAFILME. Estava me preparando para filmar quando, de repente, comecei a ver nos jornais, em outubro de 1985, fotos muito impressionantes do acampamento da Fazenda Annoni, resultado da primeira ocupação de um latifúndio improdutivo feita pelo MST. Era uma imagem completamente diferente. Resolvi ir lá ver o que era aquilo. Realmente, o meu primeiro contato foi muito impressionante, foi apenas uma visita que fiz ao acampamento com um jornalista americano com quem estava trabalhando. Daquela visita, então, nasceu, realmente, a certeza de que eu tinha que filmar ali porque era uma história completamente nova, era muito difícil imaginar que ali havia pobreza, que ali havia pessoas sem terra. Então abandonei a idéia de filmar no nordeste ou no norte do Brasil para me preparar para filmar no Rio Grande do Sul.
(...)
Quase dez anos depois de ter feito o primeiro filme, Terra para Rose(1), comecei a pensar que seria a hora de retomar aquela história. Por que? Eu tinha o desejo, evidentemente, de reencontrar aquelas pessoas e de saber o que tinha realmente acontecido com elas depois que elas começaram a ser assentadas. É claro que eu sabia vagamente o que estava acontecendo. Eu tinha alguns contatos eventuais com as pessoas da coordenação do Movimento Sem-Terra. E também o movimento dos sem-terra naqueles 10 anos se transformou num movimento nacional, atingindo uma importância política muito grande no país.
(...)
Terra para Rose é um filme muito mais épico, cheio de movimentos, caminhadas, de lutas, mas mesmo assim tentei fazer com que a história fosse contada através também de sentimentos, de emoções, chegando com a câmera sempre na intimidade e no coração dos protagonistas daquela história. No Sonho de Rose, refleti também sobre fazer um filme sobre o cotidiano de assentamentos, de fazendas. Na verdade, a vida numa fazenda é uma coisa monótona -- as pessoas acordam, vão para o campo, tiram leite da vaca, cuidam dos animais, plantam, colhem. Tentei fazer com que o foco principal no Sonho de Rose fosse exatamente o sentimento, a emoção dos personagens e a passagem do tempo... na verdade eu acho que o foco de O Sonho de Rose são as mudanças. Por isso eu também usei muito o flash-back para mostrar as mudanças que se operaram não só nas situações, mas dentro das pessoas, mudanças internas, de sentimentos, de emoções e de visões de mundo."

1 Terra para Rose recebeu a maior premiação VIII Festival Internacional del Nuevo Cine Latinoamericano, Havana, Cuba ( dezembro de 1987), vários prêmios no XX Festival de Cinema de Brasília (outubro de 1987) e o Prêmio Glauber Rocha na XVII Jornada de Cinema da Bahia ( setembro de 1988). O Sonho de Rose recebeu a premiação de melhor documentário no Festival do Rio (2000) e na XXIV Mostra Internacional de Cinema de São Paulo (2000), dentre outras em festivais nacionais e internacionais.

Sobre o autor
Tetê Morais: Diretora e produtora brasileira. Documentários pioneiros e inovadores sobre os conflitos da terra e a mulher. Várias premiações nacionais e internacionais. A mulher na luta pela terra. Gênese do documentário Terra para Rose: projeto Mulheres da Terra. Emergência de uma nova história com o acampamento da Fazenda Annoni, no Rio Grande do Sul. Sonho de Rose, dez anos depois, nos assentamentos, focaliza mudanças nas situações e nas visões de mundo.

Data:

novembro de 2002

Recurso ID:

FROMLAND195

Glossário

Compilado por Else R P Vieira. Tradução © Thomas Burns.

Fazenda Annoni
"De 9.000 hectares, localizada em Sarandi (Rio Grande do Sul), desapropriada em 1975 e que permaneceu em litígio judicial até 1987, quando mais de 2.000 famílias do MST a ocuparam. Passaram a pressionar o governo e o Judiciário para que fosse efetivado o assentamento, o que finalmente ocorreu em 1992. Em função do assentamento, deu origem a um novo município de Pontão, cujo prefeito atual é Nelson Gracielli, assentado e antigo militante do MST" (Fernandes, Bernardo Mançano e Stedile, João Pedro. Brava gente: a trajetória do MST e a luta pela terra no Brasil. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 1999, nota 1 p. 149). 

Latifúndio
Latifúndio ou grande propriedade rural tem duas definições: latifúndio por dimensão, que é o imóvel rural com área superior a seiscentas vezes o tamanho médio da propriedade familiar; latifúndio por exploração é o imóvel rural com área inferior a seiscentas vezes o tamanho médio da propriedade familiar e cujas terras não são exploradas (Fernandes, Bernardo Mançano. Pequeno Vocabulário da Luta pela Terra. Inédito). 

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)
Fundação: Em 4 DE JANEIRO DE 1984, o MST se constituiu como um movimento nacional, depois de um longo período de lutas (1979-1983) localizadas em vários estados. A fundação aconteceu durante o I Encontro Nacional do MST, realizado em Cascavel, Paraná, de 21 a 24 de Janeiro de 1984. Nesse encontro foram definidos os objetivos gerais, as principais reivindicações e as formas e organização e de luta do MST. Participaram lideranças de luta pela terra de 13 estados do Brasil.Objetivos gerais:
1 - Que a terra só esteja nas mãos de quem nela trabalha;
2 - Lutar por uma sociedade sem exploradores e explorados;
3 - Ser um movimento de massa autônomo dentro do movimento sindical para conquistar a reforma agrária;
4 - Organizar os trabalhadores rurais na base;
5 - Estimular a participação dos trabalhadores rurais no sindicato e no partido político;
6 - Dedicar-se à formação de lideranças e construir urna direção política dos trabalhadores;
7 - Articular-se com os trabalhadores da cidade e da América Latina.
Reivindicações:
1 - Legalização das terras ocupadas pelos trabalhadores;
2 - Estabelecimento da área máxima para as propriedades rurais;
3 - Desapropriação de todos os latifúndios;
4 - Desapropriação das terras das multinacionais;
5 - Demarcação das terras indígenas, com o reassentamento dos posseiros pobres em áreas da região;
6 - Apuração e punição de todos os crimes contra os trabalhadores rurais;
7 - Fim dos incentivos e subsídios do governo ao Proálcool e outros projetos que beneficiam os fazendeiros;
8 - Mudança da política agrícola do governo dando prioridade ao pequeno produtor;
9 - Extinção imediata do GETAT e do GEBAM;
10 - Fim da política de colonização" (Calendário Histórico dos Trabalhadores. São Paulo: MST, Setor de Educação. 3a. edição, 1999, p. 19-20). 

		À Universidade da página bem-vinda de Nottingham

Vozes Sem Terra, site hospedado pela
School of Languages, Linguistics and Film
Queen Mary University Of London, Grã-Bretanha

Coordenadora do Projeto e Organizadora do Arquivo: Else R P Vieira
Produtor do Web site: John Walsh
Arquivo criado em janeiro de 2003
Última atualização: 07 / 05 / 2016

www.landless-voices.org